Editorial | Dívida recorde do agro: quando o calote vira estratégia

por | ago 17, 2025 | agro, Destaques, informes, NOTÍCIAS, OPINIÃO/ARTIGO

O Banco do Brasil está descobrindo na marra que o agronegócio brasileiro não é só “pop” e “tech”. Também é, cada vez mais, devedor contumaz. A explosão da inadimplência no setor — que já atinge R$ 5,4 bilhões em produtores em recuperação judicial — mostra que o calote deixou de ser acidente de percurso e passou a ser tática empresarial.

O jogo virou
Até pouco tempo, a narrativa era de que o agro era o motor blindado da economia, imune às crises. Agora, o que se vê é uma multidão de produtores que até 2023 estavam com nome limpo e, de repente, aderiram ao script da recuperação judicial como quem troca de insumo: carência de dois anos, desconto de 20%, prazo de mais de uma década. O instrumento legal virou escudo corporativo.

O problema não é a lei, é o uso que se faz dela
A recuperação judicial foi pensada como um último recurso para salvar empresas em dificuldade. Mas no campo está virando um balcão de negócios, usado de forma preventiva e até abusiva. Advogados falam em distorção da lei; críticos enxergam fraude. O resultado é o mesmo: o risco sai das mãos do devedor e pousa direto na mesa dos bancos — e, por consequência, do Tesouro e do contribuinte.

O mito do agro sem falhas
Esse movimento joga por terra o mito do agro como setor impecável. A pujança convive com práticas pouco republicanas. Muitos produtores blindam patrimônio, pedem recuperação e empurram o problema para frente. É a lógica do lucro privatizado e prejuízo socializado.

A conta, como sempre, sobra pra alguém
Quando 20 mil produtores entram em rota de colisão com o sistema financeiro, não é só o Banco do Brasil que treme. É a economia inteira. O que era pra ser solução virou estratégia. E o mais grave: normalizou-se o calote institucionalizado.

O agro, que sempre cobrou eficiência do Estado, agora ensaia uma contradição: quer o benefício da recuperação judicial, mas sem assumir a responsabilidade de quem pegou crédito público.

No fim, o campo pode continuar verde. Mas a cor que predomina hoje é a do sinal de alerta.

Joel Silva é Jornalista de formação com pós em Mkt Político e Radialista

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